sexta-feira, 25 de abril de 2014

O SIGNIFICADO DA PÁSCOA PARA TODOS NÓS

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O trespasse do Mestre foi confirmado pelos legionários romanos de acordo com o critério da época. Foi sepultado num túmulo talhado na rocha. Não obstante, reapareceu. Seu corpo carnal emergiu do sepulcro que era aparentemente inviolável, e Jesus foi visto por muitos. Finalmente desapareceu da vista mortal, pela ascensão acima da materialidade, para um estado do ser puramente espiritual.

Que significado tem isso para os estudantes que hoje em dia estudam tanatologia (da palavra grega thanatos, que significa morte), e para aqueles que procuram a certeza de que há alguma continuidade para a existência individual depois daquilo a que humanamente chamamos morte?

 

sepulcro-vazio

 

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O significado da Páscoa para todos nós

 

Naomi Price

 

 

O que é que a Páscoa comemora? Não tragédia, mas triunfo. Não tristeza, mas alegria. As primeiras linhas de um hino, por Frances Thompson Hill, que muitas vezes é cantado nessa temporada, diz eloquentemente:

Exultemos, eis a Páscoa,
Doce luz alvoreceu.
1

 

O significado original da palavra inglesa “Easter”, que em português quer dizer “Páscoa”, é obscuro. Pode, de fato, ser derivado de Eastre ou Eostre, nome da deusa pagã da primavera e da fertilidade. Mas tem profundo significado para todos os cristãos. Vêm eles a temporada da Páscoa como a comemoração de um dos maiores momentos da história religiosa - a ressurreição do mestre dos cristãos, Cristo Jesus.

Tal acontecimento foi para os discípulos um fato extraordinário, pois ofereceu a prova indiscutível da imortalidade do homem, dando significado a suas vidas e esperança a todos os homens na terra.

Quando uma sociedade hostil entregou o melhor homem da terra à morte de um vilão, relata a Bíblia que “o véu do santuário se rasgou em duas partes, de alto a baixo” 2. Embora a humanidade não reconhecesse naquela ocasião o significado do acontecimento cataclísmico no Calvário, esse foi o sinal do fim de uma era de falsa crença teológica e o arauto do começo de uma nova época de compreensão espiritual.

Então deu-se o irromper espiritual da ressurreição. Depois disso o ensinamento crístico de que Deus é a Vida eterna, divina, haveria de se desenvolver na consciência, e a possibilidade de se provar a imortalidade da identidade do homem como expressão indestrutível da Vida seria reconhecida em proporção crescente.

A temporada da Páscoa lembra-nos acontecimentos que são imensamente importantes para a humanidade. A Sra. Eddy diz no livro-texto Ciência Cristã, Ciência e Saúde: “O martírio de Jesus foi o pecado culminante do farisaísmo. Esse martírio rasgou o véu do santuário. Revelou os falsos fundamentos e superestruturas da religião superficial, arrancou o disfarce da beatice e da superstição, e abriu o sepulcro com a Ciência divina — a imortalidade e o Amor.” 3

E foi assim que no terceiro dia depois da crucificação o grande milagre da ressurreição de Jesus proporcionou a prova tão necessária aos mortais para convencê-los de que em realidade não há morte, que a vida não tem fim, que nenhuma tristeza é legítima, que não há separação final entre amigos.

Quando Jesus surgiu do túmulo, a natureza imortal e espiritual do homem tornou-se mais do que esperança. Ficou demonstrado que essa natureza era presença - um fato que em todos os tempos vindouros podia ser comprovado.

Nas palavras da Sra. Eddy numa mensagem a uma filial da Igreja de Cristo, Cientista: “A densa escuridão da mortalidade foi atravessada. A pedra foi removida. A morte perdeu o seu aguilhão e o túmulo a sua vitória. A coragem imortal enche o peito humano e ilumina o caminho vivente da Vida.” 4

A Páscoa tem, sem dúvida, uma mensagem que intriga os pensadores de hoje. O surto atual de curiosidade a respeito da natureza da morte e da possibilidade de a vida continuar depois do que agora se declara ser morte clínica, estabelece um tema interessante para muitos que não aceitam como parte integrante de sua fé religiosa o conceito da imortalidade do homem.

A Páscoa, despojada de seus enfeites e tradições irrelevantes - ovos pintados e coelhos peludos - associados a ritos de fertilidade pagãos, fala todos os anos ao mundo na vida que não conhece a morte.

A Páscoa deveria induzir muitas pessoas a pensarem no significado que tem para elas o ordálio de Cristo Jesus na cruz, e o triunfo dele sobre o túmulo. Esses acontecimentos refutaram dramaticamente que a morte fosse um poder, negando-a não apenas em um caso, mas em todos.

O trespasse do Mestre foi confirmado pelos legionários romanos de acordo com o critério da época. Foi sepultado num túmulo talhado na rocha. Não obstante, reapareceu. Seu corpo carnal emergiu do sepulcro que era aparentemente inviolável, e Jesus foi visto por muitos. Finalmente desapareceu da vista mortal, pela ascensão acima da materialidade, para um estado do ser puramente espiritual.

Vestigios-e-Fatos

 

Que significado tem isso para os estudantes que hoje em dia estudam tanatologia (da palavra grega thanatos, que significa morte), e para aqueles que procuram a certeza de que há alguma continuidade para a existência individual depois daquilo a que humanamente chamamos morte?

Significa que não estamos condenados ao esquecimento depois de ter vivido uns poucos anos na terra. Significa que a vida é contínua, indestrutível  - que, de fato, não há morte. Isto deveria capacitar-nos a compreender que as expressões “depois da morte”, “mundo futuro”, e “mais além” são obsoletas.

Tal como o livro-texto da Ciência Cristã indica: “A Vida é real e a morte é a ilusão.” 5 De maneira que, na verdade, não podemos conhecer a morte, mas tão somente a presença contínua da Vida.

Isto significa que podemos confiar em que continuamos a viver e a estar conscientes, a nos alegrar, a nos desenvolver espiritualmente, a nos comunicar com outros e a ser companheiros deles - até mesmo daqueles dos quais julgávamos ter sido separados há muito tempo.

Há quase dois mil anos que este vislumbre feliz da continuidade da vida tem encorajado inúmeros cristãos. Com compreensão ainda que imperfeita, talvez se tivessem indagado qual seria o seu lugar e como seria a vida depois da morte, e qual a forma em que eles e seus amigos apareceriam.

Poderiam até mesmo ter questionado se era desejável viver para sempre. Mas para eles o aguilhão daquilo que parece ser morte foi em grande parte neutralizado. A alegria da Páscoa iluminou a escuridão de sua tristeza.

Mas o exemplo do Mestre mostra que não basta deixar-se meramente aliviar do aguilhão doloroso da morte. Faz-se-nos um chamado para mais do que nos espreguiçarmos indolentemente neste pensamento da inexistência da morte.

Tal como Jesus, precisamos ir adiante para atingir a meta suprema da espiritualização total do pensamento, na qual a crença mortal cede lugar à Verdade divina, em que compreendemos que o Espírito é Tudo-em-tudo, ficando provado que o ser do homem é puramente espiritual.

A Páscoa aponta para mais do que um estágio vitalmente importante do desenvolvimento da humanidade para fora de crenças mortais. A Páscoa aponta para cima, para o estágio seguinte e final.

Leva-nos a compreender e a reconhecer a imortalidade do homem como expressão de Deus. Estimula-nos para que sigamos o exemplo de Cristo Jesus até o clímax por ele alcançado e que comprovemos, como ele comprovou, nossa natureza perfeita e inteiramente espiritual na semelhança divina - mediante a ascensão.

 

1Hinário da Ciência Cristã, n° 413; 2 Mateus 27:51; 3 Ciência e Saúde, p. 597; 4 The First Church of Christ, Scientist, and Miscellany, p. 191; 5 Ciência e Saúde, p. 428.

 

Autor: Naomi Price, CSB, membro do Conselho de Conferências de A Igreja Mãe, A Primeira Igreja de Cristo, Cientista, em Boston, Massachusetts. Nasceu em Amersham, Buckiunghamshire, Inglaterra, estudando neste país e na Suíça. Dedicou seu tempo a pratica pública da Ciência Cristã, desde 1945, escrevendo com frequência para os periódicos religiosos desta Causa.

Fonte: O Arauto da Ciência Cristã, edição em português, de abril de 1979. Publicado por The Christian Science Publishing Society, todos os direitos reservados.

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terça-feira, 15 de abril de 2014

JESUS MORRE POR CAUSA DE SUA POSIÇÃO EM RELAÇÃO AO TEMPLO

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Jesus expulsa vendilhões 

Jesus subiu ao templo [depois da cena dos Ramos, que teve lugar no quadro da festa das Tendas, celebrada em setembro-outubro, no final das vindimas] e encontrou no templo aqueles que vendiam bois, ovelhas e pombos, e os cambistas assentados, e ele os expulsou a todos do templo e disse: "Tirem isso daqui. Não façam mais da casa de meu Pai uma casa de comércio". Evangelho de João

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JESUS MORRE POR CAUSA DE SUA POSIÇÃO EM RELAÇÃO AO TEMPLO

 

 

1. O TEMPLO

O templo, reconstruido por Herodes a partir do ano 19 aC, reformado completamente, no ano 64 dc, estava sobre uma esplanada  que reproduzia a acrópole de Atenas,  e constituía a pedra  angular da sociedade judaica.

Sua destruição, no ano 70, transtornou completamente a hierarquial de Israel. A aristocracia sacerdotal e leiga, de tendencia saducéia, perdeu então o poder que passou para os escribas de tendencia farisaica.

Anunciar a fim desta ordem não deixaria de criar aborrecimentos a Jesus de Nazaré.  Tudo  convergia para o templo, mesmo as realidades economicas mais concretas.

A organização dos sacrifícios, a obrigação de se peregrinar ao templo, nas três festas: Páscoa, Pentencostes, Tendas, e a celebração das Expiações. Quando o primeiro dignatário da nação ia até Deus, a festa da Dedicação em lembrança da renovada consagração do Lugar Santo, após a profanação de Antíoco Epífanes, tudo isso conferia ao templo e ao segmento social, inscrito por ele, no centro da comunidade, um valor divino.

Estas observações nos convidam a ver como, em tormo de nós, se dispões as coisas nas cidades e nas igrejas. A pesquisas abre os olhos de quem gosta da globalidade das coisas.

Segundo Templo réplica

 

2. O CULTO NO TEMPLO 

Para a consciência judaica, o templo era o lugar que Deus escolhera para morar entre o seu povo. Lá se encontrava o único altar para os judeus de todo o mundo.

O sacrifício constitia o elemento essencial da religião. Mas, é preciso distinguir:

Os sacrifícios públicos: todo dia, pela manhã e pela tarde, um cordeiro era oferecido em holocausto (Ex. 29:42) em nome da nação, representada por leigos delegados vindos a Jerusalém e pela classe sacerdotal em serviço. Este é o "sacrifício perpétuo".

Segundo Filón, um sacrifício cotidiano era igualmente oferecido às custas de tesouro romano, pelo imperador e pelo império.

Aos sábados, nas luas-novas, nas festas, o número de sacrifícios era maior. E é preciso ajuntar aos 1093 cordeiros ou cabritos, aos 113 touros e aos 32 bodes oferecidos, anualmente, uma abundancia de farinha, de vinho e oleo.

Os sacrifícios privados: eram  bastantes numerosos e corrrespondiam a diversos e variados motivos: pedido individual, expiação, reparação, ação de graças.

Além disso, no Santo do templo, onde o candelabro de sete braços era constantemente iluminado, um ritual  cotidiano era celebrado no altar dos perfumes. No mesmo local, os doze pães da proposição, reservados aos sacerdotes, eram renovados, cada sábado, sobre uma  mesa especialmente disposta para recebê-los.

As festas de Israel  tinham consideravel importância para a significação do templo. Três delas eram festas de peregrinação que levavam as multidôes a Jerusalém: Páscoa, Pentencostes, Tendas. Outras  duas: o grande dia das Expiações e a Dedicação, diziam respeito ao templo de maneira previlegiada.

A  Páscoa comemorava, na primavera, a libertação do cativeiro do Egito. Despertava também a consciência da libertação messianica. O banquete da festa tinha carater familiar, mas os cordeiros deviam ser imolados no  interior do templo. A festa dos dos pães sem levedo ou azimos, ligados a páscoa, durante sete dias.

Na festa de Pentencostes,  na festa de sete semanas, cinquenta dias depois da  Páscoa, eram oferecidas no templo as primícias da colheita de trigo. Mais tarde, esta festa será ligada com o dom da Lei do Sinai.

A festa das Tendas, celebrada no outono, no fim das colheitas e das vindimas, tinha carater popular e muito alegre. Ofereciam-se a Deus os produtos do solo. Vivia-se, durante sete dias, em barrracas para lembrar o tempo do deserto. As festas incluía ações de graças pelos bens da terra, procissões com palmas, preces para pedir a chuva e iluminações. Ela se enriqueceu com uma significação messianica urtilizada no Novo Testamento, na entrada de Jesus em Jerusalém, com os cortejos de ramos.

O Yôm Kippur, o grande Dia das Expiações, era  celebrado cinco dias antes da festa das Tendas. Incluía um jejum rigoroso e sacrifícios pelos pecados. O sumo sacerdote, obrigatoriamente, devereia presidir a celebração neste dia, o que ele fazia, em outras ocasiões, sem obrigatoriedade. Ele sacrifiicava um touro pelos seus próprios pecados e pelos da sua família e um bode pelos pecados do povo.

Entrava com o sangue das vítimas, unicamente naquele dia, no Santo dos Santos, achando que Deus alí habitava, para realizar uma aspersão do santuário. Um segundo bode, o famoso "bode da expiatório", era carregado com os pecados da nação e enviado ao deserto, mais ou menos a seis quilometros de Jerusalém.

A festa da dedicação, celebrada no fim de dezembro, durante oito dias. Comemorava-se a nova consagração do templo, feita em 164 aC., depois de sua  profanação durante a perseguição de Antíoco Epífanes. Flávio Josefo denomína-o de "Festa da luzes".  Levavam-se  ramos e ofereciam-se sacrifícios. Acendiam-se lampadas diantes das casas. Uma cada dia, nos oito dias da festa, Josefo via nisto o sinal de que a liberdade tinha resplandido.

A festa do Purin (sortes)  comemorava, nos dias 14 e 15 de adar (mês de fevereiro-março), a libertação que fala o livro de Ester. Era uma espécie de carnaval judaico, pouco religioso e pouco apreciado pelos saduceus.

 

3. A PIEDADE PRIVADA 

Depois destes detalhes sobre o culto público, é necessário mencionar a piedade e  ainda algumas práticas familiares ou privadas.

A oração: recitação do Shemá, duas vezes por dia "Escuta, Israel..." (Dt 6:4-9; 11: 13-21; Nm 15: 36-41)   voltados em direção ao templo. Utilização de bençãos para todas as circunstâncias da vida. Preces pessoais improvoisadas. Salmos. Orações antes e depois das refeições.

O jejum: para se humilhar, expiar as faltas e obter ajuda dos céus.  Os fariseus jejuavam, às terças e quintas -feiras.

A esmola: era muito recomendada pelos doutores.

As obras de misericórdia: consolar os aflitos, visitar os doentes, resgatar os prisioneiros, sepultar os mortos. 

 

4. IMPORTÂNCIA ECONOMICA E FINANCEIRA DO TEMPLO

Depois do exilio, pouco a pouco, o poder da aristocracia sacerdotal   substituiu o poder real. Mas não se modificou o modo de produção da Palestina.

Tudo, no templo, desfrutava de considerável sacralização. As receitas:  a dracma, o dízimo, as partes sacerdotais tiradas antecipadamente, dos sacrifícios, os resultados do comércio de animais consagrados ao altar, as ofertas regulares de certas famílias, os donativos de peregrinos vindos do mundo romano.

Suas despesas: as rendas dos chefes dos sacerdotes, certos gastos do culto público, os pagamentos pelos trabalhos no templo e certas despesas públicas, sobretudo, com a beneficiência. Seu papel de cofre de fundos públicos e privados: segundo Flávio Josefo, o tesouro do templo sempre suscitou a cobiça dos conquistadores e ocupantes. A administração sacerdotal destes fundos:  os três grandes tesoreiros saíam de família sacerdotais aparentadas com o sumo sacerdote.

Este formidável poder econômico se justificava por ser o templo o lugar previlegiado da presença de Deus em seu povo.

O símbolo deste comprometimento é a enorme quantidade de ouro que entrou na decoração do edifício. Se, como diz o adágio, nada é demasiadamente belo para Deus, é preciso, no entanto, sempre se informar, cuidadosamente, da origem das ofertas muitas vezes, ostentatórias.

A propósito da ruína da Cidade Santa, no ano 70 dC,  J. Jeremias escreve: "o ouro era tão abundante, em Jerusalém e, especialmente, no templo que depois da tomada da cidade, uma imensa oferta de ouro inundou a Província da Síria. Resultou disso, no dizer de Josefo, que aí se vendia a libra de ouro pela metade de seu antigo preço".  

 

5. O EXERCÍCIO DO PODER

A ordem fiscal, a ordem pública, o direito e a justiça constituem os três setores basicos em que o poder é exercido.

Os judeus suportavam bastante mal as pesadas imposições romanas. Mas também que os romanos garantiam a segurança do transporte do imposto judaico do templo. E basta lembrar que o governador Poncio Pilatos teve serios problemas, quando quis empregar parte do tesouro do templo para construir um aqueduto entre as "fontes de Salomão", no sul de Belém, e Jerusalém. Ele mandou açoitar a multidão que protestava. J. Jeremias escreve: "É com os fundos do tesouro do templo que se pagavam a manutenção dos edificios da cidade, os cuidados com a limpeza pública, o calçamento das ruas e, talvez, também a manutenção do serviço de água".

A ordem pública era assegurada, internamente, pelos romanos. Mas deixaram a iniciativa à polícia judaica  do templo para as questões ordinárias entre os judeus.

Juntar-se a outros era o  melhor meio de se viajar em paz. Mas isso nem sempre bastava. A ordem pública externa, era encargo das legiões romanas. Os judeus não faziam serviço militar. Eram isentos. Os israelitas rezavam  pelo imperador. Desde os tempos de Augusto, um duplo sacrifício era oferecido, diariamente, em Jerusalém, pelo imperador do império. Os judeus eram dispensados deste culto imperial.

As legiões estacionavam na Síria. Na Palestina, havia cinco coorte de infantaria e uma ala da cavalaria: cerca de 3.000 homens. Estas tropas auxiliares eram compostas de gregos, de sírios e de samaritanos. Mas, o grosso da tropa residia em Cesaréia, onde morava o próprio governador.  Ele ia a Jerusalém para as festas. Pequenos destacamentos ocupavam, certamente, as antigas fortalezas de Herodes.

Em Jerusalém, entre 44 a 46 antes de Jesus Cristo, havia uma coorte comandada por um tribuno romano. É difícil dizer o que aí havia, anteriormente. Na Galiléia, Herodes Antipas tinha poucas tropas e, provavelmente, estrangeiras, como no tempo de Herodes, o Grande, seu pai. Mas houve oficiais judeus na Galiléia. Mas é impossível dizer sob qual príncipe.

O direito e a justiça. O direito contém as leis seguidas pelos homens de uma determinada sociedade. O poder judiciário controla sua aplicação.

Roma tentava controlar as susceptibilidades judaicas, especialmente em matéria religiosa, através dos governadores, delegados do imperador, teoricamente dependentes do legado da Síria para questões mais importantes, mas que, de fato, dispunham de uma considerável autonomia.

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 É peciso toda força dos porteiros e sacerdotes menores para espremer a massa de peregrinos através dos Portões de Hulda, na parede sul do Templo, para conduzi-la ao longo das  galerias escuras e cavernosas sob a praça do Templo e guiá-la até o duplo lance de escadas que leva à praça pública e ao mercado conhecido como Pátio dos Gentios.

O Templo de Jerusalém era uma estrutura mais ou menos retangular, de cerca de quinhentos metros de comprimento por trezentos de largura, equilibrada no topo do monte Moriá, no extremo leste da Cidade Santa. Suas paredes externas são bordejadas por pórticos cobertos, cujos tetos de lajes, suportados por lances de colunas de pedra branca brilhante, protegem as massas do sol impiedoso.

 

TEMPLO DE JERUSALÉM II 

No lado sul do Templo situa-se o maior e mais ornamentado dos pórticos, o Pórtico Real - um salão alto, de dois andares, do tipo de uma basílica, construído no estilo habitual romano. Esse é o espaço administrativo do Sinédrio, o corpo religioso supremo e mais alto tribunal jurídico da nação judaica.

O Templo é construído como uma série de pátios em seqüencia, cada um menor, mais elevado e mais restrito do que o anterior. O pátio mais externo, o Pátio dos Gentios, onde você comprou sua oferenda, é uma ampla praça aberta a todos, independentemente de raça ou religião.

Se você é judeu - um judeu sem qualquer problema físico (sem feridas, sem paralisias) e devidamente purificado por um banho ritual -, pode seguir o sacerdote com sua oferenda através de uma espécie de grade de pedra e avançar para o próximo pátio, o Pátio das Mulheres (a placa em cima do muro avisa todos os demais para não irem além do átrio exterior, sob pena de morte).

Aqui é onde o óleo e a madeira para os sacrifícios são armazenados.   É também o ponto mais interno do Templo onde qualquer mulher judia pode chegar;  homens judeus podem continuar até um pequeno lance semicircular de escadas através do Portão Nicanor e chegar ao Pátio dos Israelitas.

Isto é o mais próximo que você poderá chegar da presença de Deus.   Zelota - A vida e a época de Jesus de Nazaré, de Reza Aslan, Editora Zahar.

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5.1 O Sinédrio

Mas a lei judaica não era outra que a Lei  de Moisés, considerada como recebida de Javé, no Sinai, para todos os israelitas. Os farizeus acrescentaram à Lei a Tradição oral de seus escribas. As questões internas do judaísmo eram,  portanto, tratadas sob a autoridade bastante direta do Sinédrio de Jerusalém.

O Sinédrio não remonta a Moisés, como pretendiam os rabinos. Ele tem sua origem nos conselhos de anciões de que o sumo sacerdote se cercou, desde os tempos da dominação persa. Parece que há provas de sua existência  desde o ano 200.

Sob a rainha Alexandra (76-67 aC), escribas leigos e fariseus entraram, maciçamente, no Sinédrio. Herodes, o Grande, exterminou quase todos os sinedritas, no tempo de seu poder.

Este grande conselho retomou suas atividades, seguramente, pelo menos no ano 6 dC, quando da chegada do primeiro governador. Esta corte de 71 membros se compunha dos chefes dos sacerdotes, dos "anciões" ou representantes da aristocracia leiga, dos escribas ou representantes da aristrocracia intelectual. O sumo sacerdote presidia a assembéia.

Ignora-se a duração do mandato dos membros do Sinédrio, recrutados, sem dúvida, por cooptação, tendo-se em vista os critérios de origem, já anunciados, e também as intervenções dos chefes políticos.

A competência do Sinédrio, diminuída sob Herodes, o Grande, foi mais ampla sob os governadores. Roma admitia, tacitamente, a competência desta assembléia, para todos os judeus do mundo. Na Judéia, ocupava-se, principalmente, das relações com o poder romano: ver, por exemplo, o processo de Jesus e Paulo.

Ocupava-se, também, da entrada em  Jerusalém do imposto do templo e dos dízimos. O imposto do templo provinha de toda bacia Mediterrânea. Cuidava da interpretação da Lei e zelava sobretudo pela guarda de seu depósito.    Enfim, o Sinédrio funcionava como corte de justiça.

Dispondo da polícia do templo, podia prender e encarcerar os delinquentes,  aplicar multas e castigo corporais  e excluir criminosos da comunidade israelita. Para uma condenação à morte era preciso reunir em tribunal de 23 membros. E, no tempo dos governadores, a sentença de morte só se tornava executória depois de ratificada pelo representante de Roma. Mas esta questão é controvertida. Parece que a administração romana, às vezes, fechava os olhos. 

Nas aldeias da Judéia e da Galiléia e nos agrupamentos judaicos da diáspora, havia tribunais locais, igualmente chamados sinédrios. Os problemas aí eram julgados conforme a jurisprudência fixada pelo grande Sinédrio de Jerusalém.

Para questões menores, muitas vezes aparece, nos textos, tribunais de três membros. É preciso assinalar o papel de rabino ordenados para jurisprudência como juízes dos tribunais.

 

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6. JESUS E O TEMPLO

6.1  Jesus anuncia a ruína do templo

O discurso escatológico começa com a predição da destruição do templo (Mc 13:1-4; Mt 24:1-3; Lc 21:5-7; Syn. n. 291).

O documento A (Evangelho, formado já um todo homogêneo, de origem palestinense, saído de meios judeu-cristãos, já existindo no ano 50 dC.) deveria conter, mais ou menos, o seguinte:

Um de seus discípulos disse: "Mestre, veja que  pedras e que construções!"    E Jesus lhe diz: "Vês estas grandes construções ? Não se deixará pedra sobre pedra que não seja destruída". Eles o interrogaram: "Dize-nos quando será isso e qual será o sinal de quando tudo isso vai acabar".

No nivel do documento A, encontramos uma profecia sobre a destruição do templo, na tradição dos profetas. "Este anuncio tinha um alcance religioso: o templo, centro do culto e lugar da presença de Deus,  era o lugar da Aliança antiga entre Deus e seu povo. Anunciar a ruína do templo era, por isso mesmo, predizer a ruptura da Aliança e a rejeição do povo de Deus" (Boismard).  Sem falar nas consequencias econômicas e sociais de tal catrastrofe.

Em que situação ficariam o sumo sacerdote e todos os bem situados na escala social judaica, com o desaparecimento do templo?  Para compreender bem a gravidade de uma palavra sobre a ruína do templo e para se perceber o perigo corrido pelos profetas que se aventuraram a enveredar por este caminho, pode-se ler Mq 3:9-12, depois Jr 7:1-15 e, sobretudo, o capítulo 26, integralmente, do profeta Jeremias.

Estevão foi também julgado por suas palavras contra o templo e a Lei (At 6:8 a 7:60), pois, apesar de At 6:13 (as testemunhas falsas), seu discurso mostra bem que ele se referia ao templo.

 

6.2 Jesus expulsa os vendedores do templo

Não vamos seguir a história, bastante complexa, da redação deste episódio (Mc 11:15-33; Mt 21:12-27; Lc 19:45 a 20:8; Jo 2:13-25; Syn. 275ss). Não temos pistas suficientes para a reconstrução do documento A  e vamos nos contentar de compreender o episódio no nível do documento C. Do texto de João, Boismard tira o relato seguinte, bem arcaico:

Jesus subiu ao templo (depois da cena dos Ramos, que teve lugar no quadro da festa das Tendas, celebrada em setembro-outubro, no final das vindimas) e encontrou no templo aqueles que vendiam bois, ovelhas e pombos, e os cambistas assentados, e ele os expulsou a todos do templo e disse: "Tirem isso daqui. Não façam mais da casa de meu Pai uma casa de comércio". 

Seria necessário reportar-se ainda a Mc 11:27b-33: os responsáveis pelo templo perguntaram a Jesus sobre a autoridade que lhe permitia tal atitude.

O sentido do gesto de Jesus, feito sem mandato de ninguém, aparece melhor se se recordar tudo o que o templo representava neste país. É preciso ainda tentar determinar, precisar o tipo de ação em questão. Não é um gesto de zelota.

Os zelotas tinham um programa de reforma do culto, no templo, e do sacerdócio. Pretendiam realizar este programa pela violência, numa perspectiva terrestre (Cullmann).

Estudando-se, bem a fundo, sua posição, vê-se que não era aquela a posição de Jesus. Eles pretendiam fazer chegar o Reino de Deus pela violência, utilizando os mesmos meios do adversário romano. Empreendiam ações de envergadura. O gesto de Jesus era irrisório a seus olhos. Não aceitavam uma mera pregação piedosa, por meio de um ato simbólico, denunciando os abusos de um culto formal e convidando para se adequarem os sentimentos interiores aos sacrifícios exteriores, mas sem questionar a própria instituição do templo.

O gesto de Jesus deve ser compreendido em ligação com a predição da ruina do templo, motivo da paixão, dado no documento A. É gesto profético que tende a desencadear uma nova era e a significá-la. No clima apocalíptico que, então tudo impregnava, o desaparecimento dos mercadores do templo significava os tempos da restauração universal, o fim de uma ordem corrompida.

Este gesto de Jesus lembra Zc 14: texto apocalíptico que enfoca o dia do Reino de Deus e a festa das Tendas e, especialmente, o v. 21: "Naquele dia não haverá mais mercador na casa de Javé Sabaot".  

Com o Acontecimento-Jesus, iniciam-se os novos tempos. A redação intermediária  de Marcos compreenderá isso, perfeitamente, citando Is 56:7  - "Minha casa  será chamada casa de oração para todas as nações". Chegou o templo das nações. Jesus encerra a era antiga.

O episódio da figueira seca, introduzido aqui pelo texto intermediário de Marcos, exprime por sua vez o fim da Antiga Aliança. Israel, a árvore escolhida de Deus, não produziu seus frutos.  

 

7. JESUS MORRE POR CAUSA DE SUA POSIÇÃO EM RELAÇÃO AO TEMPLO

Parece que os dirigentes judeus apresentaram Jesus a Pilatos como zelota (Lc 23:2). É útil ver atrás dos atuais textos referentes ao processo, diante do Sinédrio, qual o motivo exato da condenação de Jesus, encontrado no documento A.

Tomemos Mc 14:55-64; Mt 26:59-66; Lc 22:66-71; Syn. n. 342.

Por um complexo jogo de influências, os textos atuais são até bastante  semelhantes, embora a narrativa de Lucas seja muito abreviada. Eles resultam, de fato, de uma mistura do documento A e do documento B, releitura de A, na etapa do texto intermediário de Marcos.

O texto do documento A (Evangelho, formado já um todo homogêneo, de origem palestinense, saído de meios judeu-cristãos, já existindo no ano 50 dC.) já é uma encenação de uma breve reunião em que os dirigentes judeus calcularam, simplesmente, os motivos que interessariam a Pilatos, mas sem fazer um processo judaico. Pode ser lido sob o texto  de Mateus. Vamos fixar 26:59.60b.61.62.63a.65a.66b. As testemunhas, que não são falsas, atestam que Jesus disse: "Eu destruirei (Mc) o templo de Deus". Jesus não responde a esta acusação que o considerava como culpado de blasfêmia e digno de morte.

O capítulo 26 do profeta Jeremias nos fornece, vários séculos antes, aqui de que se trata, exatamente, no caso de Jesus. Do ponto de vista do sumo sacerdote, havia uma "razão de Estado" para eliminar Jesus. Jo 11:47-53 desenvolve esta tese claramente. Jesus não foi morto, pura e simplesmente, porque estava escrito nos céus, mas porque inaugurou um estilo de existência inesperado que questionava muitas estruturas e muitas pessoas. Era sua concepção do Reino de Deus na qual ninguém ainda tinha pensado.

O documento B (reinterpretação, mais ou menos ampla, do documento A, para uso das Igrejas cristãs de origem pagã. Pode ter sido o primeiro estágio de Marcos. Já existia cerca dos anos 57-58 dC.) apresenta aos cristãos vindos do paganismo uma releitura do documento A, numa interpretação muito livre. Faltando ao motivo do templo chances suficiantes de atingir seus leitores, o autor faz interferir o motivo da filiação divina, pelo menos no sentido da messianidade: Jesus, filho de Deus como Messias.

Pode-se ler o documento B em Mc 14,55.56.61b.62a.63a.63.64. Interpretação mais distante do acontecimento histórico e mais teológica. Exprime, profundamente, o motivo real da liberdade de Jesus em relação ao templo. Mas não foi ele que, assim tão claramente, funcionou na sexta-feira santa.  

A história da redação mostra como os textos atuais de Mateus e de Marcos contêm o duplo motivo de A e B. Mas é por ter repatriado a presença de Deus para o coração do homem, a começar pelo Homem-Jesus, depois de tê-la arrancado do Santo dos Santos de um templo desfigurado pelo ouro, pela segregação social e pelo abuso dos poderes sacerdotais, que Cristo foi crucificado.

 

Fonte: Jesus e as estruturas de seu tempo, Émile Morin, São Paulo: Paulus, 1988.

 Nota: sobre  "Jesus e as estruturas de seu tempo" é grande o número de obras publicadas, abordando o assunto sob diferentes perspectivas. Este texto   foi publicado para refletirmos sobre a importância do estudo da Bíblia no contexto histórico, nas dimensões política, social, cultural e econômica em que seus relatos foram escritos. Conforme recentes descobertas sobre fatos nela registrados e a opinião de estudiosos do texto bíblico, como objetivo de alcançarmos o significado espiritual das Escrituras.

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PARA REFLETIR:

 IGREJA. A estrutura da Verdade e do Amor; tudo o que assenta no Princípio divino e dele procede.

               A Igreja é aquela instituição que  dá provas de sua utilidade e que vem elevando a raça, despertando de suas crenças materiais a compreensão adormecida, para que perceba as ideias espirituais e demonstre a Ciência divina, expulsando assim os demônios, ou o erro, e curando os doentes. Glossário de Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, por Mary Baker Eddy - p. 583:14-20.

SANTUÁRIO.   O corpo;  idéia da Vida, de substância e de inteligência; a superestrutura da Verdade; o santuário do Amor; uma superestrutura material, onde os mortais se congregam para culto.  Glossário de Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, por Mary Baker Eddy - p. 595:6-9.

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terça-feira, 8 de abril de 2014

CRISTIANISMO OU CRISTIANISMO DE ORIGEM?

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O evangelho de Maria Madalena e Tomé  foi por muito tempo utilizado por cristão em suas comunidades. Apesar de serem considerados escritos não-autorizados, os apócrifos têm muito a nos dizer sobre as origens do cristianismo. Os evangelhos canônicos, os oficiais, com certeza são enriquecidos com os dados de fé encontrados nos apócrifos.

Aquilo que no início do cristianismo era simplesmente expressão devocional da fé em Jesus passou a ser um dado histórico sobre ele. E o que era histórico passou a ser dado de fé. Por isso, para conhecer Jesus sob outros prismas torna-se interessante descobrí-lo também nos apócrifos. Jesus é um só, mas os escritos sobre ele são, por assim dizer, reflexo das várias maneiras pelas quais as comunidades o compreenderam. São experiências múltiplas e diferentes. Mas, de fato,  uma se impôs como exata, tornando-se oficial.  Jacir de Freitas Farias

 

pesca abumdante

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Cristianismo ou cristianismo de origem?

 

Jacir de Freitas Farias

 

Depois da morte de Jesus - ano 33 da Era Comum - até a redação dos primeiros escritos sobre ele, por volta dos anos 60/70 E.C., temos um período vago de aproximadamente  trinta anos.  Nesse meio tempo, surgiram disputas teológicas em torno da pessoa de Jesus. Para as comunidades cristãs era de fundamental importancia compreender quem ele era.

No entanto, elas se defrontaram com o fato de que muitos discipulos  e discípulas que conviveram com Jesus já tinham morrido. Alguns, como o apostolo Paulo, por não terem conhecido pessoalmente Jesus, o anunciavam ressucitado. Outros, como Tiago, considerado irmão de Jesus  e judeu piedoso de Jerusalem, tinham outra visão da missão de Jesus, pois com ele haviam convivido. Para Paulo, a história de Jesus começa na sexta-feira e termina no domingo da ressureição. Segundo este, "em vão seria a nossa fé se não fosse a ressureição  de Jesus". Não só as cartas paulinas, mas os Atos dos Apóstolos  refletem a disputa teológica entre Tiago e Paulo.

Estudos recentes concluem que caso tivesse triunfado o Jesus de Tiago, o cristianismo teria outro perfil: mais aguerrido, de cunho judaico e menos afeiçoado ao império romano. Paulo, com certeza, anunciou a cruz de Jesus como libertação, e não simplismente para a salvação dos pecados. Impôs-se a segunda ideia, bem como a de Jesus ressucitado. 

Desse esforço coletivo para traçar o perfil do Mestre surgiram varios cristianismos, isto é, varios modos de interpretar Jesus,   os quais classificamos, a seguir, segundo sua linha mestra de pensamento e a comunidade ou pessoa que o representa:

a)  cristianismo dos ditos de Jesus (Fonte Quelle, Tomé);

b) cristianismo da cura e do caminho (Marcos);

c) cristianismo  de Jesus Filho de Deus, Messias e seguidor do judaismo (Mateus);

d) cristianismo da salvação para judeus e não-judeus (Lucas);

e) cristianismo do discurso teológico elaborado e dos sinais (João);

f) cristianismo do Jesus histórico e revolucionário (Tiago, Tomé);

g) cristianismo do Jesus ressucitado e glorioso (Paulo);

h) cristianismo  do Jesus ressucitado que mora dentro de cada um de nós de forma integrada e que nos convoca a viver e testemunhar a harmonia (Maria Madalena);

i) cristianismo gnóstico, que mostra Jesus, o ressucitado que traz a salvação (Tomé, Maria Madalena, Felipe);

j) cristianismo da apostolicidade, que indica a organização comunitária e hierarquica da comunidade para garantir a pregação da Boa- Nova do Evangelho (Atos dos Apóstolos e Cartas de Paulo).

 

Somos herdeiros desses vários tipos de cristianismos. Mateus, Lucas, Tiago, João e os demais que continuam vivos em  nosso meio. Por outro lado, o cristianismo que teve primazia foi o da apostolicidade, por ter sido ele o que norteou as várias linhas de pensamento, tornando-se, assim, o cristianismo da oficialidade, o canônico.

As outras correntes de pensamento, para também serem consideradas canonicas, tiveram de se adequar aos princípios da apostolicidade. "Os apostolos foram perseguidos teologicamente e também perseguiram pensamentos diferentes no interior das comunidades". [Cf. Farias, Jacir de Freitas et alii. O Espírito de Jesus rompe barreiras: os vários "rostos" do cristianismo segundo Atos dos Apóstolos (1-15). In: A palavra na vida. São Leopoldo, CEBI/MG, nn. 158/159, p. 17, 2001.]

Na escolha do substituto de Judas, os critérios utilizados para selecionar os candidatos são: ser varão, ter sido discipulo de Jesus durante o tempo de sua vida terrestre e ter sido chamado e enviado a dar testemunho do ressucitado. O texto biblico (At. 1: 21-26) nos revela que o escolhido por sorte foi Matias. Ao ler essa passagem de Atos, não questionamos o procedimento da escolha. Parece que houve consenso na indicação.

No entanto, esse parece não ter sido o caminho lógico. O texto que temos à disposição  já fora filtrado pela crítica. E é por isso que nos perguntamos: Por que Maria Madalena não poderia ter sido a escolhida? Só por ser mulher? Maria Madalena exercia forte liderança nas primeiras comunidades. Ela disputou, como veremos mais adiante, a liderança do grupo do apostolo Pedro. Não enquanto, o grupo dos Doze, que se impôs como único, impediu o registro de tais discussões. O evangelho de Maria Madalena nos mostra os conflitos que devem ter existido entre os apóstolos Pedro, André e Maria Madalema.

Os relatos sobre Jesus são uma infima parte daquilo que ele fez ou disse. A escolha dos fatos a serem escritos está relacionada com a experiencia da comunidade que os escreve, após te-los  guardado na memoria. Jesus nunca escreveu nada sobre si mesmo. Nunca saberemos, de fato, toda a sua história, mas intrepretação delas.

A pregação missionária, catequética e litúrgica da paixão e ressureição motivou a formação dos evangelhos canônicos. Tomé não fala da ressureição de Jesus. E Felipe chega a dizer  que Cristo primeiro ressucitou e depois morreu. Como entender esses vários modos de narrar o evento Jesus? Por que a tradição não revelou ou escondeu essas informações?

O cristianismo de João teve dificuldade para entrar na lista dos livros canônicos. Não seria o evangelho  de João parente próximo do evangelho de Maria Madalena? Segundo os apócrifos, a discipula amada de Jesus é Maria Madalena. Jesus a amou mais que aos apóstolos (evangelho de Maria Madalena 18:14). Não teria a comunidade de Maria Madalena colocado na boca de João os seus ensinamentos para que esses  pudessem ser aprovados pelos apóstolos e pela tradição? João não seria Maria Madalena, a discípula, companheira e amada de Jesus?

Boa questão! Possivelmente não teremos a resposta para ela, mas que após a morte de Jesus surgiram vários modos de interpretá-los, os quais chamamos de cristianismo, disso não podemos duvidar.

Os evangelhos canonicos e as cartas são reflexos claros do cristianismo que se firmou como "verdadeiro". Os evangelhos, sobretudo, ao contar a história de Jesus, quiseram ser uma resposta ao grupo dos que pensavam que a vida de Jesus não contava. E esses transformaram em verdadeiras obras literárias. E belezas literárias assim tão raras só podiam ser inspiradas por Deus. Os apócrifos, segundo alguns estudiosos, desde o ano 50 da E.C., corriam para fora nessa disputa teológica pelo perfil de Jesus. Ou foram colocados de lado? É o que veremos na sequencia de nossas reflexões.

A Boa-Nova de Jesus ressuscitado rompeu as fronteiras do judaismo e chegou ao império romano. Somos filhos desse ardor   missionário e apostólico. Viva Paulo e seus companheiros e companheiras de evangelização! Mas imagine se a escola de Tiago tivesse vencido Paulo e seus companheiros na batalha sobre quem detém e anuncia o perfil de Jesus? Não seríamos cristãos de outro modo? Ou já teriamos deixado de existir?   

[...] na verdade o numero de livros apócrifos, sejam eles   do Primeiro Testamento (Velho Testamento) ou Segundo Testamento (Novo Testamento), passa de cem. O fato de termos tantos escritos sobre o evento Jesus é sinal de que havia uma disputa teológica nos primeiros seculos do cristianismo. A tradição se encarregou de selecionar alguns escritos e conservá-los como canonicos. Outros se mantiveram pela persistencia e resistencia de algumas comunidades.

Também os apocrifos do Segundo Testamento podem ser classificados segundo as clássicas categorias de evangelhos, atos, epistulas e apocalipses. Enumeramos a seguir uma lista contendo alguns deles.  [No bloco dos evangelhos estão catalogados livros apócrifos que não são propriamente evangelhos, mas que foram aí colocados por razões metodológicas]

                             

Evangelhos:  Segundo dos Hebreus, dos Ebionistas ou Doze, Segundo dos Egípcios, de Pedro, de Maria Madalena, de André, de Mateus, de Matias,  de Tomé, do Pseudo-Tomé, de Felipe, de Bartolomeu, de Barnabé, de Tiago Menor, da Ascensão de Tiago, de Judas Iscariotes,  de Gamaliel, de Verdade, Pseudo-Mateu,  Árabe da Infância de Jesus,  Armênio da Infância de Jesus, História do Nascimento de Maria ou Proto- Evangelho,  de Tiago,  A filha de Pedro,  A vingança do Salvador,  A descida de Cristo aos infernos, Tradição a respeito de Pilatos, Livro do Descanso de Maria, História de José o carpinteiro,  A cura de Tibério,  Declaração de José de Arimatéia e Transito de Maria.

Atos:  de Pedro, de Paulo, de Tecla e de Paulo, de João, de André, de Tomé, de Filipe, de Pilatos ou Evangelho de Nicodemos, de Mateus, de Barnabé, dos Doze Apóstolos, de Tadeu, de Pedro e André.

Epístolas: Cristo a Abgar, Abgar a Cristo, Sêneca a Paulo, Pilatos a Herodes, Pilatos a Tibério, Paulo aos Laodicenses, Pedro a Filipe, Pilatos a César ou Anáfora de Pilatos, Carta dos Apóstolos, Terceira Epístola aos Coríntios, de Barnabé, aos Alexandrinos e de Tiago.

Apocalipses: de Pedro, de Paulo, de Tomé, de Estevão, de João, de Paulo, da Virgem e de Tiago.

 

Fonte: As origens apócrifas do cristianismo - Comentários aos evangelhos de Maria Madalena e Tomé, Teologias Bíblicas nº 16, Editora Paulinas, 2ª Edição, 2004.

Autor: Jacir de Freitas Faria, sacerdote franciscano, é mestre em exegese bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma.

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