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Eliseu segue os passos de Elias
O movimento de Elias
A adoção do culto cananeu e da incorporação da forma Cananéia de administrar o Estado de Israel, pela dinastia de Amri trouxe, entre outras, duas consequências para o povo:
- Apagou, aos poucos, a fé no Deus que quer vida e liberdade para seu povo;
- Aumentou a opressão e a violência sobre o campesinato.
Contra este desmandos, levantou-se em Israel um imenso movimento profético, uma forte oposição dos círculos fiéis a YHWH. O profeta Elias foi líder dessa resistência. Sua ação em defesa dos pobres marcou profundamente a vida do povo em Israel. Possivelmente, as narrativas sobre Elias já tiveram uma primeira redação no final do século 9 a.C. Posteriormente, foram enriquecidos com acréscimo e inseridos na obra deuteronomista (Js, Jz, 1º e 2º Sm e 1ºe 2º Rs).
Podemos dividir os textos referentes a Elias da seguinte forma:
- 1Rs 17-18; 2Rs1: a defesa da fé do povo de YHWH;
- 1RS 19: a mística do êxodo reanima o profeta perseguido;
- 1Rs 21: a defesa do campesinato violentado e empobrecido;
- 2Rs 2: 1-8: a passagem da missão de Elias para Eliseu.
“YHWH é Deus, YHWH é que é Deus! [1Rs 18:39]
Antes de mais nada, leia 1Rs 17-18!
Você pode perceber que o início dessas narrativas que você leu (17:1) e o final (18: 41-46). A questão é: Qual é o Deus que envia a chuva? É Baal ou YHWH? Para Jezabel e seus profetas, Baal tem esse poder.
Para os círculos fiéis ao Deus do êxodo, YHWH é o doador também da chuva e da fertilidade do solo. Um século mais tarde, o profeta Oséias se mostra discípulo fiel de Elias nessa mesma luta (Os 2:10-11,17 – Almeida 2:8-9; 15).
Todas as narrativas populares sobre a ação de Elias em defesa da fé no Deus do êxodo contidas nesses dois capítulos indicam na mesma direção: “YHWH é Deus, YHWH é que é Deus!” (1Rs 18:39). O próprio nome de Elias, quer dizer “meu Deus é YHWH”, define o programa do profeta. Vamos por partes.
O episódio junto ao córrego de Carit (Almeida = Querite) mostra que é YHWH quem sustenta os seus fieis, tal como na caminhada do êxodo. E Ele e não Baal quem controla a chuva, provocando seca(1Rs 17: 2-7).
Na narrativa sobre a fome da viúva de Serepta e do seu filho aprofunda a mesma questão. Serepta está situada entre as cidades fenícias de Tiro e Sidônia. Como se acreditava, aquela região estava sob o domínio de Baal. Nem na região da sua influência ele foi capaz de fazer chover para acabar com a seca. E o interessante é notar que foi lá que YHWH, o Deus de Israel, exerceu seu poder, tornando-se solidário com os mais pobres na pessoa do profeta Elias. E na solidariedade dos pobres, no pouco que tinham, o pão não faltou em suas mesas (1Rs 17:8-16).
A cena em que Elias fez a criança voltar à vida (1Rs 17:17-24) também reforça a ação de YHWH, diferentemente da dinastia de Amri que promoveu a morte(1Rs 21). Nessa prática de Elias, a viúva reconheceu nele um profeta, “um homem de Deus”.
1º Reis 18:1-46 nos mostra o confronto entre dois projetos: o que traz fome e o sofrimento ao povo e o que promove a partilha e recupera a sua vida. A dinastia de Amri adotava a religião e os costume fenícios. A corte de Samaria legitimava seus sistema de morte com a religião de Baal. Para matar no povo o desejo de liberdade, foi necessário banir a fé em YHWH.
Por isso, [Elias] enfrenteou o poder político, especialmente naquilo que lhe dava sustentação ideológica, isto é, a religião de Baal. Dessa forma, contraria os interesses da corte. E não foi por acaso que Acab e a rainha Jezabel o perseguiram, matando muitos profetas de YHWH.
Em 18:12 se diz que o espírito de YHWH conduzia o profeta de forma imprevisível. Você pode ler ainda a respeito em 2Rs 2:11-12;16. Veja também em Ez 3:12;8:3; 11:1 e At 8:39! Ao assim se referir aos profetas e ao diácono Filipe, os autores querem dizer que esses mensageiros de Deus estavam totalmente disponíveis para cumprir sua vontade. Onde quer que Ele os quisesse, eles estavam a seu serviço.
A mística do êxodo reanima o profeta perseguido
Por desmascarar a prática idolátrica da corte de Samaria, a vida de Elias correu perigo da mesma forma como seus companheiros de profecia. para salvá-la, ele fugiu. Estava desanimado. Muitos profetas de YHWH já tinham sido mortos pelo mesmo motivo . Elias se sentiu só. Perdeu as referências e perdeu seus companheiros.
Elias é alimentado pelos corvos
Da mesma forma como Moisés se dirigiu ao monte Horeb (Ex 3:1), onde tomou consciência de sua missão libertadora junto aos hebreus no Egito (Ex 3:7-11), também Elias se dirigiu à montanha, à mesma gruta (Ex 33:22). Foi, portanto, beber da fonte em que Moises bebeu.
E essa fonte tem nome. Chama-se YHWH, aquele que está junto para libertar. É o Deus da Aliança, que quer uma sociedade justa solidária. Essa mística da profecia de ontem e de hoje. Não é assim também em sua vida?
Mas há algo de novo na experiência de Deus que Elias fez. Não foi mais nos sinais simbólicos tradicionais que o profeta percebeu a presença de Deus em sua vida.
Moisés fez referência à sua intimidade com Deus, dizendo que a ação de YHWH foi uma experiência marcante, como se passassem por sua vida um vento forte (Ex 14:21; 15:10; Nm 11:31, um terremoto (Ex 19:19) e um fogo ardente(Ex 32; 19:16, 18).
Elias não sentiu mais a presença de Deus nesses sinais. A razão provável é porque os teólogos do templo de Jerusalém, e possivelmente a corte real instalada em Samaria, apresenta o Deus da tradição com aquela linguagem. Em vez de fazer memória do Deus do êxodo para promover a liberdade, a dinastia de Davi domesticou a religião de YHWH para justificar o seu poder.
Elias fala de sua intimidade com Deus de um jeito novo (1Rs 19:12-13). Mas é o mesmo Deus que continua solidário com seus profetas e que renova sua vocação em crise. A forma é que é diferente.
Ainda hoje o mesmo Deus continua se revelando na vida e na história de diferentes e sempre renovadas formas.
Elias e a defesa do campesinato violentado
Antes de mais nada, leia 1Rs 21 e procure perceber:
- Os interesses do rei Acab, os seus planos em relação à terra do campesinato;
O rei inveja a vinha de Nabot
- A posição de Nabot em relação à herança. Compare com Lv 25:23 e Nn 27:1-11; 36:1-12;
- A forma como a rainha Jezabel usou o poder régio para assassinar Nabot. Compare com o envolvimento Herodíades na morte de João Batista em Mc 6:17-29;
- A defesa que o profeta Elias faz de Nabot, bem como as ameaças que faz a Acab.
Como vimos acima, no caso de Nabot, o assassinato dele e o se deus filhos (2Rs 9:26), ilustra bem a relação entre Baal e a opressão. Aparentemente, o conflito entre os profetas de YHWH era uma disputa religiosa.
Assassinato de Nabot
Mas, o fundo social do conflito entre YHWH e Baal era, na verdade, conflito por causa da terra do campesinato que era cobiçada pela corte e pelos amigos do rei.
Elias não estava sozinho
Você já leu que junto com Elias havia muitas pessoas que também profetizavam em nome de YHWH (1Rs 18:4). Em 1Rs 20:35ss, vocês podem acompanhar a ação de mais de um deles. Já no tempo do Profeta Samuel havia comunidades proféticas.
Elias é alimentado pelos corvos
Havia também os profetas da corte que, para garantir seu ganha-pão profetizavam o que agradava ao rei, tornando-se coniventes com suas decisões.
Leia 1Rs 22:1-28 e perceba como entre esses profetas também havia os que se posicionavam de forma realista. Por isso, eram mal vistos na corte e sofriam perseguição. É o casa do profeta Miquéias (Almeida = Micaias), filho de Jemla, que apanhou de um colega profeta e foi preso a mando do rei Acab (1Rs 22:24-28). Os relatos do Livro de Miquéias se referem a outro profeta.
O profeta Eliseu também foi líder de uma comunidade de profetas. É o que você pode ler em 2Rs 2:1-18. Veja também 2Rs 4:1.30! Eles podiam ser encontrados em Guilgal – 2Rs 2:1, Betel (2Rs 2:2-3), Jericó (2Rs 2:4-5.18), no Jordão (2Rs 2:6-7) e no monte Carmelo (2Rs 2:25).
Eliseu segue os passos de Elias
Antes de continuar seu estudo procure perceber como aparecem nas relações do profeta pessoas com fome, doentes , escravas, endividadas, especialmente mulheres e crianças.
Perceba também como há referências a situações do cotidiano, tais como: a casa, a comida, a água, utensílios de cozinha e instrumentos de trabalho, além é claro, do envolvimento do profeta na conspiração contra a dinastia de Amri [leia neste blog a postagem Joás rei de Judá: uma contextualização histórica e geográfica]
Possivelmente, as narrativas sobre Eliseu foram escritas no século 8 a.C. Como o ciclo de Elias, também as tradições sobre Eliseu foram escritas, com acréscimo, na obra deuteronomista.
Não deixe de ler:
▪ 1Rs 19: 19-21 vocação de Eliseu;
▪ 2Rs 2-8 Eliseu e a luta pela vida cotidiana;
▪ 2Rs 9-10 apoio de Eliseu ao golpe que Jeú deu no rei Jorão;
▪ 2Rs 13:14-21 morte do profeta.
Eliseu e suas comunidades proféticas continuaram a missão de Elias na defesa da fé do povo em YHWH e na luta contra os desmandos e as injustiças da estrutura monárquica.
Ao lançar sobre Eliseu o seu manto, Elias não só lhe transferiu sua missão, mas também adquiriu direito sobre ele, tornando-o participante de sua personalidade, uma vez que a roupa faz parte da pessoa (1Rs 19:19; 2Rs2:8-13-14. Veja casos semelhantes em 1Sm 18:4; 24:5-7!). O fato de Eliseu destruir seu arado e seu arado e seus bois confirma essa mudança em sua vida, pois significa sua renuncia à situação que vivia anteriormente (1Rs 19:20-21).
Da mesma forma como Elias, Eliseu também se ocupou com a vida cotidiana do povo e se envolveu profundamente na política. Acompanhe o quadro a seguir e veja como Eliseu está em continuidade e confirmação da ação profética dos oráculos de Elias.
▪ Passagem da missão e personalidade de Elias para Eliseu [Elias 1Rs 19:19 / Eliseu 2:8.14.19-22].
▪ Ambos multiplicaram azeite para viúvas [Elias 1Rs 17:14-16 / Eliseu 2Rs 4:1-7].
▪ A intervenção de ambos trouxe água [Elias 1Rs 18:21-46 / Eliseu 2Rs 3:9-20].
▪ Os dois fizeram meninos voltar à vida [Elias 1Rs 17:17-24 / 2Rs 4:18-37].
▪ Ambos multiplicaram farinha/pão [Elias1Rs 17: 14-16/ Eliseu 2R 4: 42-44].
▪ Elias criticou um rei de Israel que buscou sua cura num deus estrangeiro [2Rs 1].
▪ Eliseu curou um estrangeiro que buscou sua cura no Deus de Israel [2Rs 5:1-19].
▪ Elias recebeu a missão de ungir Hazael, rei arameu Elias[1Rs 19:15 ]; mas foi Eliseu quem anunciou que Hazael seria rei [2Rs 8:11-13].
▪ Elias recebeu a missão de ungir Jeú [1Rs 19:16]; mas foi Eliseu quem enviou seu discípulo para ungí-lo [2Rs 9:1-3].
▪ Ambos conspiraram contra a dinastia de Amri e sua idolatria [1Rs 18:21 / Eliseu 2Rs 9 -10].
▪ Ambos foram ameaçados de morte [Elias 19: 1-2 / Eliseu 2Rs 6: 31].
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Fonte: Uma introdução à Bíblia: Reino Dividido, organizado por Ildo Bohn Gass, CEBI - Editora Paulus, 4ª Edição, 2007.
Nota: Eliseu segue os passos de Elias foi publicado para refletirmos sobre a importância do estudo da Bíblia no contexto histórico, nas dimensões política, social, cultural e econômica em que seus relatos foram escritos. Conforme recentes descobertas sobre fatos nela registrados e a opinião de estudiosos do texto bíblico, como objetivo de alcançarmos o significado espiritual das Escrituras.
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PARA REFLETIR:
Elias. Profecia; evidência espiritual oposta ao sentido material; a Ciência Cristã, pela qual se pode discernir o fato espiritual referente a tudo o que os sentidos materiais percebem; a base da imortalidade.
“De fato Elias virá e restaurará todas as coisas.” (Mateus 17:11.) CS 585: 9
Profeta. Um vidente espiritual; desaparecimento do sentido material ante a consciência dos fatos da verdade espiritual. CS 593:24
Milagre. Aquilo que é divinamente natural, mas tem que ser apreendido humanamente; um fenômeno da Ciência. CS 591:23
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