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Mensagem para 2014
“Ninguém
caminha sem aprender a caminhar,
sem
aprender a fazer o caminho caminhando,
refazendo
e retocando o sonho
pelo
qual se pôs a caminhar”.
Paulo Freire
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“Ao
vencedor, que guardar até o fim as minhas obras eu lhe darei a autoridade sobre
as nações, [...]
assim
como também eu recebi de meu Pai,
dar-lhe-ei
a estrela da manhã”
Apocalipse 2: 26, 28
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O significado de Mandela para
o futuro da humanidade
Leonardo
Boff
Instituto Humanitas Unisinos (IHU)
Nelson
Mandela, com sua morte, mergulhou no inconsciente coletivo da humanidade para
nunca mais sair de lá porque se transformou num arquétipo universal, do
injustiçado que não guardou rancor, que soube perdoar, reconciliar polos
antagônicos e nos transmitir uma inarredável esperança de que o ser humano
ainda pode ter jeito.
Depois
de passar 27 anos de reclusão e eleito presidente da África do Sul em 1994, se
propôs e realizou o grande desafio de transformar uma sociedade estruturada na
suprema injustiça do apartheid que desumanizava as grandes maiorias negras do
pais condenando-as a não-pessoas, numa sociedade única, unida, sem
discriminações, democrática e livre.
E
o conseguiu ao escolher o caminho da virtude, do perdão e da reconciliação.
Perdoar não é esquecer. As chagas estão ai, muitas delas ainda abertas. Perdoar
é não permitir que a amargura e o espírito de vingança tenham a última palavra
e determinem o rumo da vida. Perdoar é libertar as pessoas das amarras do
passado, é virar a página e começar a escrever outra a quatro mãos, de
negros e de brancos.
A
reconciliação só é possível e real quando há a admissão completa dos
crimes por parte de seus autores e o pleno conhecimento dos atos por
parte das vítimas. A pena dos criminosos é a condenação moral diante de toda a
sociedade. Uma solução dessas, seguramente originalíssima, pressupõe um
conceito alheio à nossa cultura individualista:
o Ubuntu que quer dizer: "eu
só posso ser eu através de você e com você". Portanto, sem um laço
permanente que liga todos com todos, a sociedade estará, como na nossa, sob
risco de dilaceração e de conflitos sem fim.
Deverá
figurar nos manuais escolares de todo mundo esta afirmação humaníssima
de Mandela:
"Eu lutei contra a
dominação dos brancos e lutei contra a dominação dos negros. Eu cultivei a
esperança do ideal de uma sociedade democrática e livre, na qual todas as
pessoas vivem juntas e em harmonia e têm oportunidades iguais. É um ideal pelo
qual eu espero viver e alcançar. Mas, se preciso for, é um ideal pelo qual
estou disposto a morrer".
Por
que a vida e a saga de Mandela funda uma esperança no futuro da
humanidade e de nossa civilização? Porque chegamos ao núcleo central de uma
conjunção de crises que pode ameaçar o nosso futuro como espécie humana.
Estamos
em plena sexta grande extinção em massa. Cosmólogos (Brian Swimm) e biólogos
(Edward Wilson) nos advertem que, a correrem as coisas como estão, chegaremos
por volta do ano 2030 à culminância desse processo devastador. Isso quer
dizer que a crença persistente no mundo inteiro, também no Brasil, de que o
crescimento econômico material nos deveria trazer desenvolvimento social,
cultural e espiritual é uma ilusão. Estamos vivendo tempos de barbárie e
sem esperança.
Cito
o insuspeito Samuel P. Huntington, antigo assessor do Pentágono e um
analista perspicaz do processo de globalização no término de seu O choque
de civilizações:
"A lei e a ordem
são o primeiro pré-requisito da civilização; em grande parte no mundo elas
parecem estar evaporando; numa base mundial, a civilização parece, em muitos
aspectos, estar cedendo diante da barbárie, gerando a imagem de um fenômeno sem
precedentes, uma Idade das Trevas mundial, que se abate sobre a
Humanidade"(1997:409-410).
Acrescento
a opinião do conhecido filósofo e cientista político Norberto
Bobbio que, como Mandela, acreditava nos direitos humanos e na
democracia como valores para equacionar o problema da violência entre os
Estados e para uma convivência pacífica. Em sua última entrevista declarou:
"não saberia
dizer como será o Terceiro Milênio. Minhas certezas caem e somente um enorme
ponto de interrogação agita a minha cabeça: será o milênio da guerra de
extermínio ou o da concórdia entre os seres humanos? Não tenho condições de
responder a esta indagação".
Face
a estes cenários sombrios Mandela responderia seguramente, fundado em
sua experiência política: sim, é possível que o ser humano se reconcilie
consigo mesmo, que sobreponha sua dimensão de sapiens à aquela de demens e
inaugure uma nova forma de estar juntos na mesma Casa.
Talvez
valham as palavras de seu grande amigo, o arcebispo Desmond Tutu que
coordenou o processo de Verdade e Reconciliação:
"Tendo
encarado a besta do passado olho no olho, tendo pedido e recebido perdão e
tendo feito correções, viremos agora a página - não para esquecer esse
passado, mas para não deixar que nos aprisione para sempre. Avancemos em
direção a um futuro glorioso de uma nova sociedade em que as pessoas valham não
em razão de irrelevâncias biológicas ou de outros estranhos atributos, mas
porque são pessoas de valor infinito, criadas à imagem de Deus".
Essa
lição de esperança nos deixa Mandela: nós ainda viveremos se sem discriminações
concretizarmos de fato o Ubuntu.
Feliz 2014
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