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Perspectiva espiritual inter-religiosa
sobre desastre ecológico
sobre desastre ecológico
John Dear
Um novo livro aborda um aspecto-chave
da crise ambiental global: o esquecimento da natureza sagrada
da criação e de como isso afeta a relação humana com o ambiente.
"Todo mundo sempre me disse que esse é um assunto encerrado, que
vai acontecer, que é infantilidade querer protestar contra isso", disse
Bill McKibben, fundador do grupo 350.org e um de principais ativistas
ambientais norte-americanos, ao The New York Times, referindo-se ao próximo
anúncio do presidente Barack Obama sobre se deve ou não seguir em frente com o
destruidor oleoduto transfronteiriço Keystone XL, de 2.800 quilômetros de
comprimento.
"Mas para mim ele nunca pareceu um assunto encerrado, porque é
muito ilógico", continuou McKibben. "Esse é o petróleo mais sujo que
alguém já conseguiu encontrar na face da Terra, e sempre me pareceu que, mesmo
diante de uma escuta remotamente justa, as pessoas perceberiam isso".
Qualquer pessoa que esteja prestando atenção e se preocupe com a Terra e
não com os lucros das companhias petrolíferas percebe que esse oleoduto será um
desastre ambiental para a América do Norte e uma enorme ameaça para o clima
global. Como o cientista da NASA e líder profético James Hansen disse a
McKibben há alguns anos, o oleoduto Keystone XL será "o fim do jogo para o
planeta".
Eu apoio plenamente os protestos em andamento contra o oleoduto Keystone
XL, e espero e rezo para que o governo Obama faça a coisa certa e se recuse a
seguir em frente com ele e tome decisões ainda mais duras para reduzir as
emissões de carbono e de combustíveis fósseis, e para proteger a criação.
Essa será a conclusão de quem ler o sábio novo livro Spiritual Ecology:
The Cry of the Earth [Ecologia Espiritual: O Grito da Terra], uma bela coleção
de artigos inter-religiosos de alguns dos nossos maiores pensadores sobre o
ambiente, a espiritualidade e as catastróficas mudanças climáticas. Os
contribuidores incluem: Thich Nhat Hanh, Joanna Macy, Wendell Berry, o frei
franciscano Richard Rohr, Brian Swimme, Thomas Berry, Vandana Shiva, Bill
Plotkin, a irmã dominicana Miriam MacGillis e Winona LaDuke, dentre outros.
"O mundo não é um problema a ser resolvido; ele é um ser vivo ao
qual pertencemos", escreve o editor Llewellyn Vaughan-Lee em sua
introdução "O mundo é parte do nosso próprio 'eu' e nós somos uma parte da
sua totalidade sofredora. Enquanto não formos à raiz da nossa imagem de
separação, não poderá haver cura (...)
Só quando os nossos pés aprenderem mais
uma vez a caminhar de uma forma sagrada, e os nossos corações ouvirem a música
real da criação, poderemos levar o mundo de volta ao equilíbrio".
Spiritual Ecology aborda um aspecto-chave da nossa crise ambiental
global: o nosso esquecimento da natureza sagrada da criação e de como isso
afeta nossa relação com o ambiente. Ele tenta articular a resposta espiritual
ao desastre ecológico que provocamos e oferece muitas intuições estimulantes.
"Os sinos da conscientização estão soando", escreve o mestre
budista Nhat Hanh. "Em toda a Terra, estamos enfrentando inundações, secas
e incêndios maciços.
O mar de gelo está derretendo no Ártico, e furacões e
ondas de calor estão matando milhares de pessoas. As florestas estão
desaparecendo rapidamente, os desertos estão crescendo, as espécies são sendo
extintas todos os dias, e mesmo assim continuamos consumindo, ignorando os
sinos a tocar".
"Precisamos de um despertar coletivo", continua Nhat Hanh.
"A maioria das pessoas ainda está dormindo. Todos nós temos um grande
desejo de sermos capazes de viver em paz e de ter uma sustentabilidade
ambiental.
O que a maioria de nós ainda não tem são formas concretas para tornar o
nosso compromisso com uma vivência sustentável uma realidade em nossas vidas
cotidianas. É hora de que cada um de nós se desperte e tome uma ação em sua
própria vida. Se despertarmos para a nossa verdadeira situação, haverá uma
mudança na nossa consciência coletiva".
"Estamos passando de uma era dominada por Estados-nação
concorrentes para uma era que está dando à luz uma civilização planetária
multicultural sustentável", escreve Mary Evelyn Tucker e Brian Swimme.
"Nunca poderá haver paz no mundo enquanto você fizer guerra contra
a Mãe Terra", escreve o chefe Oren Lyons da Nação Onondaga. "Fazer
guerra contra a Mãe Terra é destruir e corromper, matar, envenenar. Quando
fazemos isso, não temos paz. A primeira paz vem com a sua mãe, a Mãe
Terra".
"O sonho de um planeta infinitamente expansível posto inteiramente
à nossa disposição sempre foi apenas isto, um sonho, e ele está rapidamente se
tornando um pesadelo", escreve a mestre zen Susan Murphy:
"A mudança tumultuada em
grande escala cresce cada vez mais, provavelmente junto com cada dia de
normalidade. A única pergunta é que forma ela irá tomar, que ordem de choques
climáticos e crises políticas vai começar a agitar e desmontar o nosso mundo, e
como as pessoas vão reagir enquanto o mercado entra em colapso e a fonte de
abundância evapora".
"Estamos vivendo naquele que certamente deve ser o momento mais
assustador e apreensivo que já enfrentamos como espécie", continua Murphy.
"Estamos frente a uma realidade em desenvolvimento que pode tanto condenar
os seres humanos ao esquecimento, quanto nos inspirar para acordarmos para as
nossas vidas de uma forma inteiramente mais interessante.
Um caminho que começa vivendo com sobriedade e criatividade com relação
à crise do nosso planeta - não como um problema a ser resolvido através da
engenharia de uma 'bolha' humana cada vez melhor e mais segura, mas como uma
obrigação constantemente em desdobramento a começar a levar em consideração a
reconstrução de nós mesmos como seres humanos ecologicamente despertos (...)
Quando o que está em jogo é a vida na terra, todo o restante é distração".
"Eu não sei o que vai acontecer", confessa MacGillis, da
Genesis Farm. "É uma grande tristeza. Permitir a dor de tudo isso em nossa
psique - é demais. (...) O que estamos fazendo uns aos outros, e se poderemos
possivelmente acordar a tempo (...) Você tem que fazer a sua pequena parte e
você tem que ser muito, muito humilde e reconhecer que há limitações. E, mesmo
assim, o amor que eu sinto pela vida - eu simplesmente quero que ele siga em
frente! Isso é tudo o que me interessa".
"A Terra está passando por uma terrível devastação, que está sendo
causada pela sociedade, pela cultura e por um modo de vida em que todos estamos
envolvidos", continua ela. "Nós não estamos redimidos disso. Estamos
implicados, estamos dentro disso. Nós precisamos de toda a sabedoria, de todo o
apoio que possamos conseguir.
Precisamos uns dos outros... Também precisamos da capacidade de ver que
o momento presente não é a palavra final, que sempre há a possibilidade de que
possamos transcender as nossas próprias limitações - o planeta, a Terra, a
sociedade podem fazer isso. É possível acreditar nisso e trabalhar nessa
direção. Isso é tudo o que podemos fazer".
"A Terra e os seus sistemas de vida, dos quais todos nós dependemos
inteiramente (assim como de Deus!), podem em breve se tornar aquilo que irá nos
converter a um estilo de vida simples, à necessária comunidade e a um sentido
inerente e universal de reverência ao Sagrado", escreve Rohr.
"Todos
nós respiramos o mesmo ar e bebemos a mesma água. Não há versões judaicas,
cristãs ou muçulmanas desses elementos universais".
"Eu sei que não são mais as palavras, as doutrinas e os sistemas de
crenças mentais que podem ou que irão revelar a plenitude desse Cristo
Cósmico", conclui ele. "Esta Terra, de fato, é o próprio Corpo de
Deus, e é a partir desse corpo que nascemos, vivemos, sofremos e ressuscitamos
para a vida eterna. Ou tudo é parte do Grande Projeto de Deus, ou então devemos
nos perguntar se algo realmente o é".
"Ao nível de sobrevivência que estamos nos aproximando rapidamente,
as nossas tentativas de nos distinguirmos por diferenças acidentais e
históricas, e por sutilezas teológicas - ignorando o claro 'pano de fundo' -
estão se tornando uma perda de tempo quase blasfema e um desrespeito chocante
para com a vida una, bela e multitudinária de Deus. Eu ainda acredito realmente
que a graça é inerente à criação, e que Deus e a bondade ainda terão a última
palavra".
Spiritual Ecology me ajuda a refletir sobre o nosso desastre ecológico
atual e a futura catástrofe que estamos trazendo sobre nós mesmos, a meditar
sobre essa realidade assustadora mediante a sabedoria das religiões do mundo e
de alguns dos nossos melhores escritores espirituais.
Eu o recomendo àqueles que buscam entendimento espiritual à luz dessa
catástrofe e a todos que estão tentando simplificar as suas vidas, protestar
contra o oleoduto Keystone XL e contra outros atos destrutivos, e acordar para
as necessidades da Mãe Terra.
"Lembremo-nos do nosso papel como guardiões da Terra, custódios dos seus caminhos sagrados e voltemos mais uma vez a viver em harmonia com os seus ritmos e leis naturais". Esse é o epílogo final do livro - uma boa oração para todos nós e um caminho a seguir.
Fonte: texto, traduzido por Moisés Sbardelotto - Instituto
Humanitas Unisinos (IHU), escrito pelo jesuíta norte-americano e
ativista pela paz John Dear, indicado
ao Prêmio Nobel da Paz pelo arcebispo anglicano Desmond Tutu. O artigo foi
publicado no sítio National Catholic Reporter, 09 de julho de 2013.
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