segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O PROFETA NÃO É BEM RECEBIDO EM SUA CASA (Lc 4,21-30)

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O profeta não é bem recebido em sua casa (Lc 4,21-30) 
Edmilson Schinelo 

 

Não é este o filho de José?

encontro jesus pescadores - Cópia

 

Na sinagoga de sua cidadezinha, Jesus havia acabado de ler no livro do Profeta Isaías: O Espírito do Senhor me ungiu para anunciar a boa notícia aos pobres (Lucas 4,16-19). Sentado, observado por todos com atenção, ele proclama: Hoje se cumpriu aos vossos olhos essa passagem da Escritura (Lucas 4,21). Suas palavras despertam admiração e respeito. Mas ao mesmo tempo, escândalo: Não é este o filho de José? (Lucas 4,22).

 

Qual a causa de tanto espanto? (Lc 4,22-24)

Jesus havia afirmado que o Espírito estava sobre ele. Logo sobre ele, uma pessoa simples ali da aldeia, o filho de José, que todo mundo conhecia! Ele não era sequer sacerdote do Templo! Com que ousadia afirmava ter recebido o Espírito? Por trás destas perguntas, ainda nos dias de hoje, está outra indagação: será mesmo verdade que a salvação vem dos pequeninos?

Mas não era só isso! Sob ação do mesmo Espírito, ele havia proclamado o Ano Jubileu, ano de graça do Senhor, ano do perdão das dívidas (Lucas 4,19), como lemos em Deuteronômio 15,1-18 e em Levítico 25,8-55.

De muitas leis, o judaísmo não se esquecia, mas esta era melhor não lembrar: aceitar o Ano do Jubileu significaria parar de acumular, dar descanso à terra, perdoar as dívidas contraídas pelos mais pobres, buscar a igualdade... Melhor tapar os ouvidos.

Nenhum profeta é bem recebido em sua pátria, conclui Jesus (Lucas 4,24). Com essa frase, ele mesmo dá o critério da autenticidade de seu ministério: a rejeição. Na história de seu povo, verdadeiros profetas e profetisas eram rejeitados (cf. Jeremias 26,11; Amós 7,10-13).

Jesus cuidado dos pobres

 

Os de casa rejeitam, quem é estrangeiro acolhe (Lc 4,25-27)

Jesus recorre à vida de seu povo, a histórias bem conhecidas na Bíblia para ajudar a comunidade a superar o escândalo.

A primeira é a da Viúva de Sarepta, cujo nome, infelizmente, não foi preservado. Havia muitas viúvas no meio do povo judeu, e Elias foi enviado a uma viúva estrangeira em Sarepta, na Sidônia.

A história está em 1Reis 17 e é uma passagem muito bonita: Elias chega faminto, é acolhido por uma mulher e uma criança também famintos. Há relação de confiança e de acolhida, e as vidas são salvas. Não só a da viúva e de seu filho, mas também a do próprio Elias.

A segunda história tem a mesma lógica: havia muitos leprosos a serem curados em Israel, mas Eliseu cura novamente um estrangeiro, o sírio Naamã (2Reis 5).

 

 

Se os de dentro do seu povo não o aceitam, Jesus deixa claro que encontrará fé e adesão entre os de fora. E o questionamento se nos faz automático: estamos nós, pessoas que nos julgamos "de dentro", aceitando de verdade a proposta? Que testemunho a sociedade cristã ocidental vem dando à humanidade? Ou continuamos aceitando a perseguição a nossos profetas e profetisas?

 

Passou no meio deles e prosseguiu o caminho (Lucas 4,28-30)

O Evangelho de Lucas foi escrito entre os anos 80 e 90 do primeiro século do cristianismo. E recolheu, como todos os evangelhos, histórias contadas de boca em boca, a tradição oral das comunidades.

A escolha das duas histórias (a de uma viúva e de um leproso, ambos estrangeiros) mostra com clareza a preocupação da comunidade de Lucas em mostrar que a abertura ao diferente, aos estrangeiros e às estrangeiras, já vinha de Jesus. Um bom "puxão de orelhas" para nossas comunidades ainda permeadas de tanto preconceito, de resistência ao ecumenismo e de tão pouco diálogo interreligioso!

E o que fazer com gente de nossas comunidades que finge não enxergar e que não quer abrir a cabeça e o coração? Não adianta o confronto direto, é melhor passar no meio deles e seguir o caminho (Lucas 4,30). É preciso encontrar estratégias de resistência e de sobrevivência para que o projeto não seja lançado no precipício. Com a ternura de sempre, com a força e a graça do Espírito!

 

 Nota: “O profeta não é bem recebido em sua casa (Lc 4,21-30)” de Edmilson Schinelo não representa necessariamente a opinião deste blog, nem de nenhuma das igrejas, sociedade ou grupos de estudos do Movimento da Ciência Cristã. Foi publicado para refletirmos sobre a importância do estudo da Bíblia em seu contexto histórico, nas dimensões política, social, cultural e econômica. Conforme recentes descobertas sobre fatos nela registrados e opinião de estudiosos do texto bíblico, como objetivo de alcançarmos o significado espiritual das Escrituras.

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domingo, 17 de fevereiro de 2013

“O ESPÍRITO DO SENHOR ME UNGIU PARA ANUNCIAR A BOA-NOVA AOS POBRES” (Lc 4,16-21)

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“O Espírito do Senhor me ungiu para anunciar
a boa-nova aos pobres”
(Lc 4,16-21)

Ildo Bohn Gass

 

 

Movido pelo Espírito de Deus...

Na sequência, o evangelho deste domingo apresenta um resumo da prática de Jesus de Nazaré (Lucas 4,14-15). Ele vivia em meio a seu povo, participando de sua vida de fé. Ensinava nas sinagogas da Galileia, na periferia da Palestina.

Jesus Pregando na Sinagoga no sábado

 

Toda sua missão é movida pelo dinamismo do Espírito (Lucas 3,22; 4,1.14.18). Para as comunidades de Lucas, a ação de Jesus é inseparável do Espírito profético, o Espírito de Deus. Convém que tenhamos presente que a força do Espírito do Senhor também conduziu João Batista e Maria, Isabel e Zacarias, Simeão e Ana (Lucas 1,15.35.41.67; 2,25-27.36).

Apresentando a missão de Jesus dinamizada pela força do Espírito, a comunidade lucana nos desafia a que também nós abramos nosso coração ao Espírito Santo e nos coloquemos a seu serviço, a serviço da libertação de todas as formas de opressão, promovendo a vida.

 

... para libertar os pobres...

A narrativa a respeito da leitura de trechos do profeta Isaías feita por Jesus na sinagoga de Nazaré (Lucas 4,16-21) insere-se numa narrativa mais ampla, pois, na sequência, Lucas descreve a reação diante do anúncio desse evangelho (boa-nova) aos pobres. Uns aprovam. Outros têm dúvidas (Lucas 4,22-23). E há quem rejeita o projeto de salvação para os mais desamparados (Lucas 4,23-30). O que não é possível é ficar indiferente.

A boa-nova para uns é uma má notícia para quem deseja continuar vivendo à custa dos pobres. Essa é a razão por que se enfureceram, o expulsaram e queriam precipitá-lo do cimo da colina (Lucas 4,28-29).

Como ontem, ainda hoje se repete a mesma situação. Qualquer liderança que assume a promoção dos mais pobres, de modo que possam ter pelo menos três refeições por dia e viver com dignidade, continua sendo caluniada e perseguida. E isso não somente pela mídia comprometida com o poder econômico, mas também por políticos e até por setores de igrejas e tribunais. Não é por acaso que Jesus vê motivo de alegria para as pessoas perseguidas por lutarem pela justiça (Mt 5,10-12).

 

 

Em Lucas 4,16-21, temos a apresentação do programa de Jesus num dia de sábado na sinagoga de Nazaré, sua terra natal. É o projeto do reinado Deus. Na sinagoga, era costume rezar alguns Salmos, ler e comentar um trecho de algum livro da lei (Pentateuco) e outro de algum livro profético. Jesus escolhe três fragmentos do livro de Isaías para anunciar o coração do projeto de Deus.

“O Espírito do Senhor está sobre mim, pois ele me ungiu para anunciar a boa-nova aos pobres: enviou-me para proclamar a libertação aos presos (Isaías 61,1) e, aos cegos, a recuperação da vista (Isaías 35,5); para dar liberdade aos oprimidos (Isaías 58,6) e proclamar um ano de graça do Senhor” (Isaías 61,2).

Essa missão libertadora vem do Deus da vida, pois é conferida a Jesus pelo próprio Espírito do Senhor, por quem já fora ungido como o messias por ocasião do seu batismo (Lucas 3,22).

A missão do messias é de esperança de vida digna, certamente para todas as pessoas, mas especialmente para quem está excluído da cidadania. Em quatro afirmações, Jesus faz memória da profecia de Isaías para descrever em que consiste a sua missão de “anunciar uma boa-nova aos pobres”.

Primeiro, “anunciar uma boa-nova aos pobres” é “proclamar a libertação aos presos”. Por um lado, é a libertação de quem sobrevive em condições subumanas nos presídios, onde a grande maioria está em consequência dessa sociedade desigual, injusta e de exclusão. E, no tempo de Jesus, a maioria das pessoas que se encontrava na prisão eram presos políticos que resistiam contra a opressão e a violência do império romano.

Por outro lado, a proposta de Jesus é libertar-nos de todas as formas de prisão, de tudo aquilo que nos impede de sermos nós mesmos, de sermos livres, sem deixar-nos guiar pelo egoísmo, por vícios, pelo individualismo, pela ganância, pelo consumismo, pela ambição, etc. Senhor, liberta-nos de tudo o que nos aprisiona e impede de sermos radicalmente livres.

Foto feita  em 2002,  exposta na Mostra “A eloquência do sangue”, de Rogério Ferrari, apresenta a realidade nua e crua da Palestina sob ocupação.

 

Em segundo lugar, “anunciar uma boa-nova aos pobres” é levar “aos cegos a recuperação da vista”. É, sim, curar a cegueira física, mas é muito mais. É também curar a nossa ‘cegueira’ quando não enxergamos a realidade por estarmos com a visão embaciada ou com ‘viseiras’ que impedem vermos a realidade em toda a sua amplitude.

É curar a nossa ‘cegueira’ quando não vemos com nossos próprios olhos, não pensamos com nossa própria mente, não escutamos com nossos próprios ouvidos e, por isso mesmo, não dizemos nossa própria palavra, mas reproduzimos as ideias do pensamento dominante na sociedade.

Senhor, recupera as nossas vistas. Dá-nos forças para alcançarmos clareza em nossas mentes e corações, a fim de ampliar o nosso discernimento conduzido por seu Espírito.

Em terceiro lugar, “anunciar uma boa-nova aos pobres” também é “dar liberdade aos oprimidos”, seja diante da opressão social, mental, econômica, psicológica, política, afetiva ou religiosa. Senhor, que teu amor mova nossos desejos, possibilitando-nos a graça de sermos pessoas próximas, solidárias com quem vive na opressão.

Por fim, “anunciar uma boa-nova aos pobres” é “proclamar um ano de graça do Senhor”. Anunciar o ano de graça do Senhor é proclamar o ano jubilar que fazia parte da tradição do Antigo Israel. Nos livros do Deuteronômio e do Levítico fala-se desse jubileu. Primeiro, era uma reforma feita a cada sete anos (Deuteronômio 15,1-18). Mais tarde, passou para cada 50 anos (Levítico 25,8-55).

Era o ano do perdão das dívidas que, muitas vezes, levavam à perda da terra, das casas e da própria liberdade. Por isso, ao anunciar o ano jubilar, além do perdão das dívidas, o Espírito do Senhor move Jesus para anunciar vida plena, o que também inclui terra para quem está sem terra, moradia para quem está sem teto e liberdade para quem sofre trabalho escravo.

 

... ontem e hoje

No passado, o Espírito animava a profecia na proclamação da boa-nova da libertação para os pobres (Isaías 61,1). Fiel à missão que o Espírito lhe confiara no batismo (Lucas 3,22), Jesus atualiza essa profecia, igualmente movido pela força do Espírito (Lucas 4,18). É por isso que diz: “Hoje, se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura” (Lucas 4,21).

No nosso batismo, também somos ungidos pelo mesmo Espírito Santo e assumimos o mesmo programa de Jesus. Por isso, podemos dizer com ele que, em nós, “hoje, se cumpriu aos vossos ouvidos essa passagem da Escritura”. Que a graça de Deus nos ajude a colocar-nos no mesmo caminho da profecia, no caminho do Espírito do Senhor.

 

 Nota:  “O ESPÍRITO DO SENHOR ME UNGIU PARA ANUNCIAR A BOA-NOVA AOS POBRES” (Lc 4,16-21) não representa necessariamente a opinião deste blog, nem de nenhuma das igrejas, sociedade ou grupos de estudos do Movimento da Ciência Cristã. Foi publicado para refletirmos sobre a importância do estudo da Bíblia em seu contexto histórico, nas dimensões política, social, cultural e econômica. Conforme recentes descobertas sobre fatos nela registrados e opinião de estudiosos do texto bíblico, como objetivo de alcançarmos o significado espiritual das Escrituras.

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Para refletir:

ESPÍRITO.  A substância divina; Mente; o Princípio divino; tudo o que é bom; Deus; só aquilo que é perfeito, sempiterno, onipresente, onipotente, infinito.”    CS pp. 594: 19 

BATISMO. Purificação pelo Espírito; submersão no Espírito.”  CS = Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras de Mary Baker Eddy, pp. 581:24.

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domingo, 10 de fevereiro de 2013

UM GESTO POUCO RELIGIOSO

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Um gesto pouco religioso

José Antonio Pagola

teólogo espanhol

 

 

“Havia um casamento na Galileia”. Assim começa este relato em que nos é dito algo inesperado e surpreendente. A primeira intervenção pública de Jesus, o Enviado de Deus, não tem nada de religioso. Não acontece num lugar sagrado. Jesus inaugura sua atividade profética “salvando” uma festa de casamento que podia ter terminado muito mal.

Naquelas aldeias pobres da Galileia, a festa de casamento era a mais apreciada por todos. Durante vários dias, familiares e amigos acompanhavam os noivos comendo e bebendo com eles, bailando danças festivas e cantando canções de amor.

Foto: Rede Record, F.B. Schell/The Story of The Bible

 

O evangelho de João diz-nos que foi no meio de um destes casamentos onde Jesus deu o “primeiro sinal”, o sinal que nos oferece a chave para entender toda a Sua atuação e o sentido profundo da Sua missão salvadora.

O evangelista João fala-nos de “milagres”. Aos gestos surpreendentes que realiza Jesus, chama-lhes sempre “sinais”. Não quer que os seus leitores fiquem no que possa haver de prodigioso na sua atuação. Convida-nos a que descubramos o seu significado mais profundo. Para isso oferece-nos algumas pistas de carácter simbólico. Vejamos apenas uma.

A mãe de Jesus, atenta aos detalhes da festa, dá-se conta de que “não lhes resta vinho” e diz ao seu Filho. Tais vezes, os noivos, de condição humilde, viram-se inundados pelos convidados. Maria está preocupada. A festa está em perigo. Como pode terminar um copo de água sem vinho? Ela confia em Jesus.

 

Entre os camponeses da Galileia o vinho era um símbolo muito conhecido da alegria e do amor. Sabiam-no todos. Se na vida falta a alegria e a falta de amor, em que pode terminar a convivência? Maria não se engana. Jesus intervém para salvar a festa proporcionando vinho abundante e de excelente qualidade.

Em Caná Jesus transformou a água em vinho,  curou o filho de um nobre que estava em Cafarnaum (João 4:46–54). Caná foi também o lar de Natanael (João 21:2).

 

Este gesto de Jesus ajuda-nos a captar a orientação de toda a sua vida e o conteúdo fundamental do seu projeto do reino de Deus. Enquanto os dirigentes religiosos e os mestres da lei se preocupam com a religião, Jesus dedica-se a fazer mais humana e leve a vida das pessoas.

Os evangelhos apresentam Jesus concentrado, não na religião, mas na vida. Não é só para pessoas religiosas e piedosas. É também para quem ficou decepcionado pela religião, mas sentem necessidade de viver de forma mais digna e ditosa. Por quê? Porque Jesus contagia fé num Deus em quem se pode confiar é com Ele que se pode viver com alegria, e porque atrai para uma vida mais generosa, movida por um amor solidário.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos (IHU)

 

Nota: “Um gesto pouco religioso” não representa necessariamente a opinião deste blog, nem de nenhuma das igrejas, sociedade ou grupos de estudos do Movimento da Ciência Cristã. Foi publicado para refletirmos sobre a importância do estudo da Bíblia em seu contexto histórico, nas dimensões política, social, cultural e econômica. Conforme recentes descobertas sobre fatos nela registrados e opinião de estudiosos do texto bíblico, como objetivo de alcançarmos o significado espiritual das Escrituras.

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Para refletir:

VINHO.  Inspiração; compreensão. […]  Ciência e Saúde com Chave das Escrituras por Mary Baker Eddy pp. 598: 17

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